Tanto tempo havia se passado que mal se lembrava de todos os acontecimentos de sua vasta existência.
Não, estava mentindo. Séculos passavam pela sua mente em
fração de segundos e ela mentiria descaradamente se dissesse não lembrar de
nada. Coisas ficavam adormecidas, mas nunca esquecidas, bastava uma fagulha pra incendiar pensamentos. Assim ela caminhava
noite a dentro, pensando e repensando fatos que teimavam em rondar sua mente
secular. Inacreditável como ainda era encarada com admiração e medo
por todos que cruzavam seu caminho. Isso porque há muitos e muitos anos as
pessoas não falavam sobre coisas do tipo que ela era, então mal notavam. Com uma beleza enlouquecedora e olhos mais
negros que a noite, ela caminhava absorta e digamos até desatenta com tudo à
sua volta. Captando apenas alguns olhares furtivos enquanto ela passava.
- Vontade de saltar até a torre mais alta e escura e
observar as estrelas de uma forma que só os antigos sabiam. (dizia ela a si
mesmo) - Mas na falta de torres de observação, fico por aqui mesmo. (diz já
puxando uma cadeira numa mesa num conhecido Bistrot que ala frequentava, onde o
garçom vendo-a, já vinha trazendo uma taça de vinho tinto). - Merci.
Toma um gole do vinho, voltando aos seus devaneios. Felizmente,
a vida se assim pode dizer, sempre lhe fora generosa e sua falta de decoro
em alguns negócios nunca fora um problema pra ela, afinal, esse era seu maior trunfo,
persuadir pessoas e tomar aquilo que queria pra si.
Sapatos caros, roupas, bolsas, viagens, as melhores bebidas.
Todas companheiras inseparáveis durante todo aquele tempo. Casos passageiros,
sexo sem compromisso. Sorri ao se lembrar de quantos levara pra cama com uma lábia
que só os da sua família possuíam. Homens, mulheres, homens e mulheres que se
amontoavam em seu leito se deleitando em prazer e bebida. Ao amanhecer, alguns jaziam sem vida e
outros, poupados, mas com uma mente sem lembranças. Vazio.
Mas o que era isso pra ela? Nada! Desde que ele a deixou,
nunca mais foi completa. Seu coração sem vida havia se fechado para sempre e as
luzes daquela cidade sempre lhe traziam lembranças.
- Mas que tola estou sendo. *vira os olhos em sinal de
desaprovação aos seus próprios pensamentos*
- Mon amour fatalmente me
recriminaria por pensamentos tão tolos e pior, ainda diria que nada como uma
boa dose de sexo regado a muito champanhe para dissipar os pensamentos.
- Eu concordo. Sexo e champanhe são combinações perfeitas
para uma mente em conflito...
A voz doce e metálica, surgira por de trás dela sem que ao menos
ela percebesse tal aproximação. Realmente, estava se tornando uma tola. Uma
velha tola e desatenta.
- O que pode se tornar
ainda mais conflitante, pois nunca se sabe o resultado de tal ato. – Diz virando-se
devagar e graciosamente. Mas tamanha é sua surpresa que seus olhos de predador
a traem e brilham mais que as estrelas do céu. Em segundos ela o mede, sua pele
morena brilhava à luz da lua. Seus olhos castanhos eram de um brilho e de uma
força que ela nunca vira igual, ou melhor, só uma vez em séculos. Cabelos
negros e levemente compridos, denotavam sinal de displicência e charme. Ele era
alto e nem seus sapatos de saltos altos feito sob medida para seus pés, ficavam
a altura do estranho a sua frente.
- Explique-se. *diz o homem que sem cerimonias, já puxava
uma cadeira para sentar-se*.
- Ora Cavalheiro, não há muito que explicar, as conclusões são
obvias como equações matemáticas.
Ele arqueia a sobrancelha esperando que ela
explicasse melhor. Ela impulsiona um pouco o tronco para frente e diz com a voz
calma e melodiosa.
- Simples. Sexo, tal qual a champanhe, seduz e inebria. Para
uma mente cheia de dúvidas isso pode ser uma arma e tanto. *ele esboça menção
de falar, mas ela o cala com o dedo* - Escute, digamos *falava pausadamente* que
tenha sofrido algum dissabor seja ele de qualquer tipo, e convida ao seu leito,
mulheres ou uma mulher, para se distrair, achando que seria só mais
umas ou uma, que seja, tudo isso regado ao champanhe mais caro e mais gelado
que existisse no mundo...
Ele a olhava atento,
sem perder nenhum gesto dela.
-...Então percebe que tudo ali está tão delicioso e
perfeito, que seus dissabores se dissiparam por completo, aquela mulher ou aquelas mulheres *sempre dava ênfase no plural* foram tão boas, tão sexy's e tão certas quanto as
bolhas do champanhe. E ao amanhecer, você só consegue pensar em como aquela morena
de olhos profundos tinha uma bela boca carnuda que fazia coisas que nem sonhava
quanto aquela loura, estonteante, se movia como uma sílfide dançando em cima do
seu corpo.
Ele a olhava com lábios semicerrados, tentando esboçar
alguma reação e quando decide falar, ela novamente o encara dizendo...
- Aí, vai chegar a seguinte conclusão com a tamanha dor de cabeça que o perseguirá
durante todo o dia, pelas inúmeras garrafas consumidas durante toda essa orgia: Seus dissabores se foram, mas a combinação de álcool e sexo em excesso são bem mais confusas do que parece e as vezes, mandar matar alguém é bem mais simples. Tenho ou não razão senhor...?
Ele joga a cabeça pra trás gargalhando muito alto enquanto
lhe estende a mão para cumprimentá-la.
- Sinceramente Senhora, seus argumentos são dignos de uma sessão em um tribuna, eu só não gostaria de ser o réu. Prometo que vou me lembrar disso na próxima vez que levar pra minha cama,
mulheres e garrafas de champanhe. Se bem...* franze o cenho* ... que não me
recordo de ter em meu leito mulheres e garrafas, no máximo uma de cada. Devo
pensar sobre o assunto? - Von Colt,
Gabriel Von Colt.
Gabriel, Gabriel. Ela repetia pra si. Já o tinha visto? Não,
ela se lembraria, pois só em um ser no mundo ela tinha visto cabelos tão
negros e olhos tão profundos. Seu amado marido, Raphael. E aquele homem, se ela já o tivesse conhecido, com certeza se lembraria.
- Charlotte Simmons.
Ele se endireita na cadeira e leva a mão aos cabelos num
gesto de desaprovação. – Perdão pela minha falta de jeito senhora. *levanta-se
de repente*. Eu nem fui convidado a me sentar e já fui logo lhe questionando e
o pior, sentando-me sem sua permissão. Mas falava com tanta convicção e paixão,
que não resisti.
Pela tumba da minha rainha, quem é esse? Chego a salivar e o
liquido negro em mim, posso jurar que quis mudar a temperatura.
- Por favor Sr. Von Colt, sente-se e se não for ousadia
minha... Beba comigo. Mas devo alerta-lo, desta vez, sem champanhe. Acho que
dei argumentos suficientes para provar que as bolhas as vezes nos traem.
Concorda?
- Em gênero, número e grau Sra Simmons.
- Charlotte apenas, por favor. *sorri com um aceno leve de
cabeça*
- Então, Charlotte apenas, posso pedir mais uma taça de
vinho?
Intrigante. Já andara por aquela cidade, milhares de vezes.
E nunca tinha visto essa criatura que do nada lhe aparecia na frente. Humano.
Sangue corria quente pelas suas veias. Perfume quente e inebriante. Quem
borbulhava agora era minha mente e não o champanhe. Mas ele não oferecia risco
para mim, eu sim a ele. Ou estaria enganada?
- Até a garrafa...
- Até a garrafa...
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